Ney Matogrosso - Turnê “Bloco Na Rua” – Arena Jockey

 

Em uma noite de 23 de novembro de 2024, o Arena Jockey, no Rio de Janeiro, torna-se palco do espetáculo Bloco na Rua, de Ney Matogrosso – uma performance que transborda ousadia estética e sonora, reafirmando o status do artista como um dos maiores ícones da música brasileira. Ao longo do show, Ney se reinventa mais uma vez, explorando um território que vai além dos limites da sua carreira solo. O público, em sua maioria carioca, mas também de outras partes do Brasil, se entrega a uma experiência que é tanto um festival de sentidos quanto uma verdadeira homenagem à sua arte multifacetada.

O nome da turnê, extraído da irreverente composição de Sérgio Sampaio, “Eu Quero É Botar Meu Bloco na Rua”, não é apenas uma referência ao espírito do carnaval de rua, mas um manifesto que encapsula a liberdade criativa de Ney. Ao fazer esse movimento, ele se distancia da rigidez de uma produção tradicional, avançando para uma musicalidade mais fluida e imprevisível, sem medo de se arriscar e explorar novas sonoridades. Em vez de apenas se apresentar como intérprete, ele se coloca como curador de um espetáculo experimental que dialoga com o legado de outros compositores e com a sua própria história artística.

A seleção do repertório, sem dúvida, é um dos maiores acertos da noite. Além dos seus clássicos, como “O Beco” e “Mulher Barriguda”, Ney se apropria de canções de Raul Seixas e DJ Dolores, construindo uma ponte entre diferentes gerações e estilos, com cada canção provocando uma reação única no público. A mistura de gêneros e influências é feita com maestria, levando a plateia a um turbilhão de emoções, ora alegres, ora melancólicas, mas sempre permeadas pela densidade de uma interpretação visceral e carregada de ambiguidade. Não se trata de uma simples execução musical – Ney se entrega a uma performance onde o ato de cantar é, ao mesmo tempo, um gesto de desafio e um convite à introspecção.

No palco, Ney Matogrosso continua sendo a definição de presença avassaladora. Seu corpo se transforma a cada movimento, sua voz ultrapassa os limites do convencional e, assim, ele se coloca acima da mera atuação musical. O espetáculo não é apenas um show, mas um ritual de transfiguração, onde o artista não apenas interpreta, mas faz a arte acontecer no corpo e na alma de quem o assiste. Cada canção, cada nota, cada passo no palco é uma busca incessante pela beleza e pela verdade de uma arte performática que não conhece fronteiras.

Ao escolher o Arena Jockey para essa celebração, Ney faz uma aposta certeira. O espaço, embora vibrante, mantém uma aura intimista, criando um ambiente perfeito para um encontro simbiótico entre o artista e seu público. Ali, o espetáculo ganha um caráter ainda mais pungente, como se o bloco que Ney convoca fosse tanto físico quanto emocional, exigindo que os presentes se entreguem de corpo e alma à experiência.

E, por fim, o que se percebe ao longo de Bloco na Rua é uma leveza poética que permeia cada segundo do espetáculo. Embora o público se renda ao carisma e à presença inegáveis de Ney, o show não se limita a uma simples celebração da música. Ao contrário, é um convite à reflexão, um espelho de como a excentricidade e o brilho de um artista podem tocar as partes mais profundas do ser humano. Ney Matogrosso é, na verdade, um arquétipo de conexão entre o épico e o trivial, capaz de transitar entre essas esferas com uma elegância rara, nos lembrando da beleza que surge quando se desafiam as convenções da arte e da vida.

 

Por Mauro Senna

Foto: MSenna

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