Grande Sertão

 

Grande Sertão

 Sob a direção perspicaz do cineasta e diretor de televisão Guel Arraes e a reescrita astuta do cineasta e roteirista Jorge Furtado, "Grande Sertão" desponta como uma grandiosa produção cinematográfica nacional que assume o papel de anfitriã perante os amantes, em especial, da literatura experimental modernista brasileira, presenteando-os com uma intrépida versão áudio visual exploradora do universo labiríntico do clássico de Guimarães Rosa, "Grande Sertão: Veredas".

A reimaginação da jornada de Riobaldo e da sua busca por identidade e redenção, não apenas atualiza a narrativa para os tempos contemporâneos, mas também desafia as fronteiras entre o que é tido como real e ficcional.

O transplante da saga dos jagunços para o cenário intrincado das favelas se revela um gesto audacioso e revelador. Diadorim e Riobaldo, interpretados magistralmente por Luisa Arraes e Caio Blat, retratam não somente companheiros de aventuras, mas essencialmente, testemunhas das vicissitudes de uma sociedade marcada pela violência e pelo conflito. Em meio ao caos urbano, onde os muros separam e, ao mesmo tempo, confinam, a dualidade entre o bem e o mal, se manifesta muito além da índole dos personagens, mas nas estruturas que os cercam.

Mérito marcante – a habilidade do filme na exploração das nuances psicológicas de seus personagens. Eduardo Sterblitch brilha como Hermógenes, personificando a escuridão que permeia o coração humano. Sua presença em cena é uma constante lembrança da fragilidade da moralidade em um mundo onde a linha entre o certo e o errado é constantemente borrada. Luisa Arraes traz uma sensibilidade arrebatadora ao papel de Diadorim, através de uma figura que personifica a coragem e a vulnerabilidade em igual medida. Sua jornada de autodescoberta e aceitação é um lembrete poderoso do poder da identidade em meio ao caos da guerra.

Além do elenco estelar, a direção de Guel Arraes demonstra o seu grande esforço para alcançar a essência cinematográfica da obra de Guimarães Rosa, em sua capacidade de equilibrar momentos de intensa ação com reflexões contemplativas – fato comprobatório  de sua maestria como contador de histórias. A escolha de ambientar a trama nas favelas não representa apenas uma decisão estética, mas uma afirmação do compromisso do filme em dialogar com as realidades sociais e políticas do Brasil contemporâneo.

"Grande Sertão" é mais do que uma simples adaptação literária, mas uma reflexão sobre a condição humana e as complexidades do mundo em que vivemos. Diante da tradução das palavras do autor literário para as telas, o filme nos lembra que, mesmo em meio ao caos e à escuridão, há sempre espaço para a esperança e a redenção. É uma obra que ressoa não apenas com o passado glorioso da literatura brasileira, mas também com as preocupações e aspirações do presente cada vez mais seco.

 

Resenha: psales e msenna

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