Cano Serrado - Dependendo do grau de negacionismo do espectador

 

Ao desenhar uma história que enxerga a segurança pública como instituição aliciada pelos processos de tortura e aos vícios da corrupção, e a religião a serviço da alienação dos indivíduos tementes às forças divinas, o cineasta Erik de Castro se entrega à emoção extrema e define um ponto de vista argumentativo que não encontra resposta em seu longa ‘Cano Serrado’.


Rubens Caribé interpreta o sargento Sebastião que, logo na primeira sequência do filme, encontra o corpo de seu irmão caminhoneiro, com um tiro no rosto, à beira da estrada, transformando o fato algo em algo pessoal e merecedor de vingança por parte da corporação – fato que o retrata como um representante da autoridade de segurança pública que acredita reconhecer um meliante por mero instinto.


Durante uma incursão de policiamento noturno, Sebastião e sua tropa deflagram um ataque a tiros a dois indivíduos que se dirigiam a um retiro religioso e que, supostamente, teriam sido os responsáveis pela morte do irmão do sargento.


Sem saber que se tratavam de policiais, fizeram de prisioneiro o sobrevivente após terem enterrado o outro em cova rasa e terem ateado fogo ao veículo que as vítimas conduziam, como tentativa de queima de arquivo.


Uma vez no batalhão, o policial prisioneiro, religioso, casado e pai de família, vivido por Jonathan Haagensen, é torturado com violência desmedida, mesmo alegando não saber o motivo de tal atrocidade.


O desaparecimento dos policiais causa estranheza aos seus colegas da capital, fazendo com que o delegado interpretado por Fernando Eiras reúna seus auxiliares, vividos por Silva Lourenço e Milhem Cortaz, e partem em busca dos dois.


O espectador mais atento poderá fazer um exercício crítico dos personagens, uma vez serem os torturadores tementes a Deus, corruptos e manipuladores, e os pastores, ignorantes ou coniventes quanto à origem do dinheiro que recebem de seus fiéis.


Embora ameace um viés de similaridade com um thriller policial, o longa de Castro encobre uma camada política que, dependendo do grau de negacionismo do espectador, poderá até mesmo encontrar um motivo plausível para os absurdos cometidos pelos personagens durante uma hora e vinte e seis minutos. Afinal, a contemporaneidade ainda se encontra submersa em momentos sombrios.
resenha: psales e msenna

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